Em meio a tantos sorrisos e vozes
altas, um fitar de olhos pairava em minha direção. Um olhar que não olhava, mas
que me via. Meu despertar foi de encontro ao movimento da visão. O tempo se
consumiu, em segundos se refez no que era sério, penetrante, fugaz, mas que não
irradiava medo. O sol do meio dia rompia árvores de longas sombras, os estudantes
corriam de um lado a outro com a ansiedade de sempre e professores e alunos se
misturavam ao se assentarem em banquetas de cimento tendo a suas disposições
mesas de concreto. Por que o meu medo? Já não andei bastante no caminho do
ensino? Não. Houve mudanças. O verbo aprender não indica o tempo, nem recomenda
um momento exato. Aprender é instruir-se, conhecer um pouco mais do tudo é
apreciar o nada. O meu coração bateu forte enquanto o sinal durou, depois que
parou, cessou também a aceleração. Dizem que o medo paralisa, a mim não
paralisou, mas a mistura da coragem e o medo provocaram um terremoto, meus
joelhos confessaram o tremor. Andei em direção à sala, confesso, meio sem
direção.
A primeira conversa foi de uma rara
calma, acho que não encantei, mas convenci. Trinta nomes, rostos desconhecidos.
A expectativa desvirtua o ser e faz soma de dois: bom + bom = agradável. Bom,
+, ruim = caos na sala.
O sinal soou como uma trombeta, o
meu respirar se desfez como um balão de ar. Final da aula. Lugar novo é
estranho, tem muita coisa para ver. Digo estranho, pois, provoca emoção
despercebida, desatenta, que quando desperta, não acrescenta.
Um velho num quadro acrescentou.
Abri os olhos, sorri da minha burrice, nunca havia lido Machado de Assis.
A gravura na parede revelava minhas
tolices. Não tive culpa por ser tolo. Machado não é uma obrigação, é uma
consciência. Isso faltou a mim e ao professor que me forçava ler quando tomei
gosto por leitura. Herculano ficou gravado na minha memória, mas hoje eu o
troquei pela beleza de um Dom Casmurro. Penso em como foram os meus dias com
Herculano. Os gibis da Mônica, do tio patinhas e os de bang-bang. Livros espíritas,
filosofia, teologia e psicologia. Aprofundei-me nos livros de autoajuda. Queria
buscar segurança em mim, na verdade queria gritar: sai de mim Herculano! Meu
amor por livros não lhe pertence.
Hoje eu comprei um Machado, não pretendo cortar árvores, quero cortar de
mim o amor que Herculano quis impor ao apresentar Dom Casmurro. Essa coisa de
amor demais apaga o encanto. Amor para ser amor precisa apresentar graça, lisonjas,
enlaçar doçuras, conquistar. Depois mostra a verdade, que para mim tem seu próprio
tempo para existir.
O olhar que não me
olhava, mas que me via, voltou a me encontrar. Com visão demorada esbarrei naqueles
olhos como quem não queria ver. A agitação dos estudantes voltou a ganhar
formas, com mais pessoas, os que eram e também os que não eram. A turma “A” se
comportou bem. O programa educacional ganhou seu primeiro dia, eu ganhei
certezas, certas para um recomeço.
Pouco a pouco a multidão se dissolvia. Do grupo ficaram alguns jovens,
alguns professores e o diretor. De costas para mim, os cabelos da cor da noite
ausente da luz da lua, cobriam-lhe os ombros. O tempo desandou. Andou com as
horas. A sirene soou e a multidão dos que não eram, inundou o pátio. Senti
saudades, pensei no quase velho que sou hoje. Uma professora saiu aos gritos
praguejando um adolescente que fugiu da sua justiça. Pediu-me para que
repreendesse o menino. Não podia, as minhas lembranças não permitiam, fiz pior
que o garoto na mesma idade. Consciência pesada omite a ordem.
Os jovens que estavam sentados
levantaram-se fazendo menção de ir embora. E aqueles olhos que me conhecia, não
de fala, mas de olhar, voltou a me inundar. Olhos que falam por silêncios,
esperam encontrar corpos que desmerecem as palavras. Hevelin é cativante, de
beleza rara e doçura nos gestos, de rosto meigo e olhar singelo, mas que não
revela facilmente os seus mistérios. Eu precisava de amizades, ela buscava um
amigo. Ambos descobertos num tempo que não era nosso, mas que existiu ali, por
um olhar que não me olhava, mas que me via.
Parabéns, poeta!
ResponderExcluirObrigado
Excluirmuito boaa sua crônica...parabéns.. ;D
ResponderExcluirValeu Samy obrigadooooo
ExcluirMuito bom Nil. Mais um espaço para os amantes da arte e desta bela cidade de Vilhena.
ResponderExcluirValeu cara obrigado
ResponderExcluirMuito bom Nilson!! Que você continue com este talento brilhante. Parabéns...
ResponderExcluirvaleu meu mano, obrigado pela força
ExcluirLegal !
ResponderExcluirParabens !