domingo, 23 de setembro de 2012

LUIZA, EU GOSTO DO SEU NOME

                                                                       
Ela estava sentada na arquibancada da quadra do colégio, tinha feições de choro e, sozinha, rejeitava o mundo. Era tão pequena para um grande mundo. As dores? Maiores que o universo. Com onze anos, pensava que os adultos não tinham dores humanas, afinal, onde estão os meus pais? Ou melhor, onde estão os pais? Questionava. Questionava e questionava. As suas perguntas eram grandes como o abandono. O seu pai tinha uma nova namorada e outra casa. A sua mãe, um novo namorado e a ficção de que encontrara o príncipe encantado. As princesas e os príncipes encantados roubam das pessoas o direito de serem pessoas. 
A sua data de nascimento não era tão distante da sua idade atual, mas ela já se apaixonara. Já namorara e também já trocara de garoto três vezes. O encanto de um príncipe dura até se acostumar com o outro. Ninguém está preparado para se acostumar com alguém. A beleza perde a essência quando se acostuma e é nesse momento que precisamos ser fiéis, não ao outro, mas a nós mesmos.
Ela não gostava dos espelhos, mas gostava de maquiagem. Maquiagem sem espelhos distorce a beleza. Ela não gostava de estudar, mas sabia que para entender as respostas precisava de conhecimentos e, para isso, era necessário ler. Ler muito. Mas não queria. Estava presa nos questionários que roíam por dentro. As indagações lhe cansavam a alma, doía o corpo, mas mesmo cansada não conseguia dormir. Depressão.
Quem me escolheu para viver? O meu pai de nova namorada não se lembrava de mim. Quem me escolheu para amar? A minha mãe apaixonada me via, mas não me enxergava. Quem me escolheu para ficar comigo? A minha avó, mas não foi na paixão dela que eu nasci. Nem sei por que nasci. Sei que tenho um nome, que tenho que ir para a escola, que tenho tantas coisas... Mas tudo isso não têm sentido.
Perguntas. Ela se questionava. Queria se ajustar ao mundo. Perdeu a vontade de viver. Fazia planos. Muitos planos, mas sempre o mesmo plano. Quando morresse ninguém ia se importar. Deixaria uma carta? Para quem a carta? Não tinha amigos, não estava namorando, nem falava muito com a sua avó. Para quem uma carta? Para os professores? Eles iriam desviar seus planos.
O barulho da quadra foi se ausentando. A claridade foi amarelando até encontrar a escuridão. Tudo escurecera.
Quando ela acordou encontrou-se rodeada de pessoas. Demorou para reconhecer a sala onde estivera algumas vezes, a sala da diretora. Há dias não se alimentava direito e nem dormia. Desmaiara e foi socorrida por algumas pessoas que estavam na quadra.
Depois que todos se afastaram, a professora Sandra sentou-se ao seu lado. Acariciou-lhe os cabelos e a abraçou. Não disse palavras. Uma atitude diz mais que as palavras. A menina sentiu-se amada sabendo que a professora não era da sua genética, mas que preenchia a falta dos seus pais.
— Como é o seu nome? Sandra perguntou tendo ela no colo.
— Luiza, professora.
Sandra encheu os olhos de lágrimas e juntas choraram pela mesma dor que o tempo ajuntou ali. Tinha treze anos quando uma professora com o nome Luiza lhe salvara a vida. Depois que a salvou, permaneceu por perto, até ela encontrar uma razão para viver.

— Luiza, eu gosto muito desse nome.
 Sandra refletiu. Sentindo um passado que não passava.