O homem mediu o terreno.
Riscou, rabiscou e, virando o papel ao contrário, fez dois riscos cruzados.
Esticou os braços e, com uma afastada vista, certificou-se do X. Sorriu.
Amassou o papel e atirou-o longe. Depois que ele se afastou veio outro homem,
mais moço que o primeiro. Mediu novamente o terreno. Riscou e riscou. Rabiscou
um pedaço de papel, observou-o de todos os ângulos. Sacudiu a cabeça em sinal
de reproche. Amassou as pequenas folhas e arremessou-as longe. Um menino que
perto estava desamassou-as. Olhou, olhou, olhou. Sorriu. Um riso sarcástico.
Meneou a cabeça em sinal de desaprovação e, quando estava para arremessar os
manuscritos, notou que passava uma mulher. O menino fez vários acenos antes de
entregar-lhe os papéis. A mulher observou o terreno, comparando os escritos.
Sorriu e, com os movimentos de quem copia números da TV, leu os rabiscos e
observou a base da construção em processo inicial. A mulher sorriu. Quando
chegou a casa mostrou os papéis ao marido, que depois de conferir os rabiscos,
saiu às pressas para o local. Meia hora depois estava de volta. Trancou-se em
seu escritório e só saiu quando o dia já beirava a noite. Tinha ele um riso nos
lábios e papéis novos nas mãos.
O homem, engenheiro requisitado e de currículo invejável, mediu o terreno.
Certo de que estava tudo em ordem, checou o material de trabalho. Podia começar
a obra? O menino, sorrindo, achou que estava muito cedo e que o pai era muito
apressado. O moço, irmão do engenheiro, disse que precisava rever os projetos;
uma obra daquelas carecia de um bom planejamento, mas não fora consultado para
ajudar com os desenhos. A mulher, calada, mas que antes importunava o marido,
não gostou de ver seus canteiros de flores fora do projeto. O engenheiro
considerou a opinião de todos, mas no final faltaram-lhe as certezas. Quando as
dúvidas esvaíram-se, começaram as chuvas. Quando as chuvas cessaram, faltaram
os operários.
O engenheiro concluiu a obra. Para ele a dificuldade da Torre de Babel
não começou no meio da obra. A dificuldade da língua existia dentro deles. O
desentendimento foi um processo, a fala, o resultado. Cansado, ele concluiu a
construção. Falando a mesma língua, mas não a mesma fala.