No dia onze do mês de maio, às
19h28min, contei os passos, eram necessários três antes de chegar à porta e
nove até chegar ao púlpito, receber o microfone da mão do apresentador e
começar a minha palestra. A plateia aguardava por mais uma apresentação. Terceira
noite seguida, a poltrona quinze estava vazia. As cadeiras eram numeradas
devido aos sorteios no fim de cada dia de conferência.
Na minha
primeira apresentação naquela cidade, estava eu motivado à motivação. No embalo
do primeiro dia me senti engraçado, a plateia sorria até mesmo quando eu falava
sério. Fiquei preso na beleza de um rosto na segunda fila, cadeira quinze. Era
o único rosto que não sorria das minhas piadas, mas meneava a cabeça em sinal
de concordância quando alguma das minhas palavras a tocava. Ela mantinha a
cabeça inclinada para baixo, levantava, concordava e permanecia imóvel aos
risos da multidão.
Antes que eu
terminasse, saiu em direção à porta lateral.
Sem perder o
raciocínio, eu a segui com os olhos, até que ela se ocultou da minha visão.
Na primeira
noite, os cabelos estavam soltos. Havia nela um sorriso disposto a qualquer
gracejo do colega ao lado. Ela erguia a cabeça, lançava um olhar rápido em
minha direção, olhava para o colega ao lado, batia com o ombro nele e voltava a
abaixar cabeça.
Na segunda
noite os cabelos estavam presos num coque por um lápis. O celular a chamava a
todo instante e ela alternava entre sair e entrar. Assistir ou não a palestra
era determinado por um celular. Notei como ela mexia na bolsa, apertava o aparelho
e saía às pressas pela porta lateral. Minutos depois retornava e por alguns
minutos mantinha a atenção presa ao aparelho. Como estariam os cabelos dela na
noite terceira? Quantas vezes ela falaria ao telefone na terceira noite? Num
espaço de tempo em que eu não soube medir, caminhei enquanto falava até bem
próximo à moça. Ela tinha um piercing no lado esquerdo do nariz, sobrancelhas
pretas desenhadas, olhos verdes que se destacavam por entre cílios pretos
retocados por rímel e batom cintilante. Os cabelos presos num coque expunham a
beleza dos seus ombros e a pequena tatuagem no pescoço, uma clave de sol,
desviou os meus olhos do seu olhar. Ela parou de digitar, desligou o celular e
voltou a atenção para mim. Quando me afastei, percebi, ela retornou ao celular.
Entre as 363 pessoas presentes ali apenas o seu rosto grudou em mim. Quis
conhecê-la. Saber se ela aprendeu o que eu tinha para ensinar.
Na manhã do dia seguinte,
separei alguns jornais a fim de lê-los. Tenho esse costume, saber das notícias
locais nos hotéis em que fico.
Na página
primeira, um rosto explicava o vazio da cadeira quinze na terceira noite:
“Jovem
de dezenove anos é atropelada enquanto enviava mensagens pelo celular. A moça
passou por cirurgia e continua em estado grave”.