terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A MELHOR CANÇÃO

http://www.youtube.com/watch?v=_J_ZDInX9TY 

Os acordes são simples, a melodia poderosa. Da letra importa apenas aquela parte que fala do tempo, quando nos escondíamos um no outro e não pensávamos no tempo. “Guarde um pedacinho de você... pra lembrar de mim a vida inteira...” Esse é um recorte da canção que movia os nossos momentos. São essas palavras que vejo escritas naquela fotografia que ela, naquela tarde de inverno, guardou no bolso do meu casaco. O casaco era grande, vestia nós dois, de uma só vez. E foi isso que fizemos. Ela enfiou o braço direito e eu vesti o braço esquerdo. Foi engraçado caminhar abraçados vestindo o mesmo blusão. No começo, os nossos passos se estranhavam, depois encontramos o ritmo certo e caminhamos sem tropeços. A vida a dois nem sempre é como as canções, mas chega um momento em que, pelo querer, aprendemos o ritmo, criamos a harmonia e desfrutamos da melodia do outro.
Da minha janela vejo o trem passando. Já faz anos, mas a cena é nova, a visão é nova e, no entanto, pareço estar no mesmo lugar, mas movendo os passos dentro de mim. Em cima da TV há um relógio digital; nele conto o tempo passando. Na TV, um programa reporta músicas antigas. Michael Sullivan segura um violão, Paulo Massadas rabisca os dedos em um teclado enquanto Rosana canta. Custe o que custar  é mais que uma canção. No meu colo, ela dorme como na segunda noite do nosso casamento. Nossos corpos não são mais leves. Os seus lábios, distraídos, parecem soprar-me os recortes da melhor canção.  

ESTRANHO JEITO DE AMAR

FOTO DE REPRODUÇÃO
            Um dia a gente aprende da forma mais simples o que complicamos pra saber. Sem pensar, tomamos rumos sem rumos. Não gosto de leituras. Agora lendo esse livro é que percebo como me sinto nesses últimos dias. Tenho vinte e três anos e ainda nem completei o segundo grau. Não reclamo o tempo, não negocio o agora e nem invoco o futuro. Meus pais são separados. Tinha treze anos quando ele saiu de casa. Não tenho irmãos. Moro com o meu pai, mas também com a minha mãe. Tenho dias para um e dias para o outro. Essa semana o meu tempo é do meu pai. Acho que vamos surfar. Ele está de férias. Não estou de férias, apenas sem trabalho. Sou Ananda Rossi. Gosto dos espelhos. Não gosto da cor dos meus cabelos. Queria que eles fossem pretos como os da minha mãe. Meu pai gosta do meu jeito Rita Lee, desde que eu os deixo compridos. No feriado de Corpus Cristi, a minha mãe quis que eu a acompanhasse. Penso que visitamos todas as lojas do shopping. Ela comprou um sapato, depois de gastar metade da minha paciência na escolha. Vi um celular e comprei. Tenho dificuldade com escolhas. Na minha rua, mora o meu problema: meu amigo Darlon diz gostar de mim e fala que vai esperar até que eu goste dele. Tive vários namorados, mas gostei de um que me ameaçou, dizendo que me mataria se me visse com outro. Fiquei confinada por dentro. Rasgando sentimentos de medo, até que, numa briga de gangue, eliminaram o Mancha. Às vezes, detesto o jeito que o Darlon me trata, mas aí penso no Mancha e me conforto: saber que alguém nos ama é mais confortável que saber que alguém nos odeia.