quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O VISÍVEL INVISÍVEL


            Eu só olhei para eles. Acho que bem lá no fundo eles também me olharam, com olhos que eu não podia ver. Senti ali, pelo instinto que me fez chegar e demorar aos seus pés, seus olhos invisíveis, carregados de mistérios. Sei que havia gritos em suas almas e que vozes de sabedoria rasgavam os seus silêncios. Eles se parecem com os humanos. Têm corpos, têm silêncios e suas palavras são audíveis. Eles se abrem e se fecham, dependendo de quem se aproxima. Falam apenas quando são procurados. São discretos.
            Nossos silêncios conversavam enquanto nos admiravam.
            Como quem chega cheio de anseios, ergui a cabeça e contemplei-os. Estendi as mãos e ameacei tocá-los. Eles pareceram sorrir, mas quem riu foi o meu coração. Há quanto tempo estavam ali? Será que conversavam entre eles e falavam de mim? Tenho uma leve sensação que mencionam o meu nome quando a semana passa num gotejar de tempo. Sei que demoro vê-los, quase não apareço, mas o meu coração procura por eles instintivamente. O Eu que sou hoje foi modelado pela sabedoria dos seus dizeres.
Estavam na estante. Pensei folheá-los, cheirá-los... Sentir sua textura. Tem gente que gosta de cheirá-los quando estão novos, outros preferem um cheiro velho, eu prefiro amar seus cheiros em todos os tempos. Os homens nascem livres para tantos desejos, visitar livros é o meu maior gosto. Eu estava ali com o coração estendido a eles, no intento de tocá-los, com toques demorados, um por vez, mas no meio de tantos anseios, eu só olhei para eles, com demorada visão.