sábado, 28 de março de 2015

ENSAIO SOBRE O NADA



       ... Uma dimensão impercebível. Princípio de todas as coisas. O fenômeno se cria, rompe, toca o inesperado. O sim e o não, o tudo e o Nada. Na ausência, no vazio, no som do silêncio de tudo o que existe. Em tudo o que existe há o Nada. Tudo tem a sua maneira de existir e existir é isso, saber da essência de ser nada.

O Nada é um princípio, um ajuntado de minúcias, um escolher sem sentir, um acordar sem despertar, um pensar sem refletir.

São necessários um pouco de ‘cada mínimo’ para chegar ao tudo. Olhar o céu e sentir ausência de nuvens e ver todo o seu azul tomando conta da gente. O azul é o tudo, mas também é o Nada.

Ouvir uma canção, sentir carência de silêncio. O vazio em cada espaço do tempo em ritmo, como no acontecer da vida. A canção quando invade é tudo, mas há nela uma essência do Nada.

Uma tela em branco, o branco é o Nada, mas é o tudo de um início. Após um ponto, um rabisco ou um deslizar de pincel, o tudo se faz, brota a imagem, revelando a existência da contemplação. E contemplar também pode ser isso: o transbordar do Nada.

E a palavra quando chega? Um poema se faz e a poesia acontece. Depois foge da gente. Largando sentimentos que surgem dos de repentes Nadas.

O mesmo corpo que sente o tudo também se esbalda ao Nada. Estamos cheios de tudo, abarrotados do Nada. Somos sim e não, tudo e Nada. E o instante que tudo revela, revela também isso: ser instante é ser a luz que o Nada acende. O Nada criou o tudo. Um é afirmação do outro. O tempo é a confirmação deles e o viver uma desinência.

Quero descrever o Nada, o tudo já me aborrece. E se em Clarice o Tudo começou com um sim, houve também a participação do Nada. E se a terra era sem forma e vazia, havia nela o Tudo da beleza do Nada. E se sei que nada sei, sei da profundeza do Nada. Apesar de querer saber tudo o que o Nada faz.