terça-feira, 21 de junho de 2016

O 3º OUTRO



Quando vi o relógio dentro da caixa no balcão de vidro, escapou de mim um “é esse”. O primeiro impacto me levou a um desejo antigo: era desse que eu precisava. Quanto sonhei com uma relíquia daquela no pulso direito. Observei o preço. Analisei as formas de pagamentos. Contei meus trocados. Os valores se equivaliam.
Olhei o mostrador, o pino para dar corda, a pulseira, o fecho, os ponteiros. Meu coração era de um menino recebendo a primeira bicicleta. Sim, será esse! As formas de pagamentos também eram instigantes. Poderia pagar com cheques, com cartão de créditos, mas optei por cédulas. A atendente observou o meu gosto antigo e lançou-me um sorriso de selfie. O desdém da atendente jogou luz nos meus desejos. Pensei em como abandonar um sonho antigo. Foi com esse pensar que descobri os Outros que há em mim.
O primeiro Outro queria o relógio antigo porque era sonho de criança.
O meu avô ostentava com brandura a relíquia comprada em uma das suas viagens, que ele dizia, ter feito na Suíça.  Já o meu pai adquiriu a sua relíquia na 25 de março. Como o meu avô, o meu pai adorava dizer as horas. E quando ninguém perguntava, dizia: é um relógio caríssimo, mas costuma atrasar as horas.
O segundo Outro, desejava o relógio antigo para o pai.
O presentearia no seu aniversário: vinte e cinco de dezembro. Quem sabe o velho sentirá orgulho dos meus negócios e não mais me culpará pelo sumiço do seu relógio.
O terceiro Outro, entrou na loja seduzido pelas propagandas.