sábado, 3 de junho de 2017

O ONTEM VIVO HOJE


É bizarro sentir a falta do que passou, ou do instante chamado “ainda há pouco”. A frase: “era feliz e não sabia” é apenas uma fuga dos momentos que fazem do “agora” uma certeza. A gente corre tanto. Inveja tanto. É difamado tanto.  E tanto também é mal interpretado. Ninguém tem paciência de compreender o outro, de olhar o outro, de escutar o outro, ou até mesmo ser o outro. Mas vive intensamente incomodado com o outro. Ele tem, ele possui, ele é feliz, ele é triste, ele é trabalhador, ele é preguiçoso, ele é corrupto, ele é artista: bom, ruim, médio. O outro é. É sempre o outro. O “É” é tão mínimo que não dá ao outro o direito de “será”.
Não cabe dizer. Tudo bem, até existiu felicidade num “era feliz e não sabia”, mas   onde? Em qual silêncio podemos encaixar um: “porra, sofri pra caralho”!? Se naquele tempo estávamos como estamos agora: fugindo da infelicidade e da dor.          
Olhando o passado. Lá tudo é tão bonito.
A gente ria. Sentávamos no chão e ríamos. Quando voltávamos para casa, a televisão machucava nossa dor. Jogávamos bola de meia. Comprávamos fitas cassete, usávamos roupas simples. A comida era simples (quando tinha), quando chegávamos em casa a televisão alfinetava nossa existência.
Não sei o que faz pensar que tudo ontem era melhor que hoje. A gente busca tanto, espera tanto, anseia demasiadamente por um futuro melhor que atropelamos o “agora”, e não sentimos. Até para ser feliz é doído. A felicidade incomoda. Dizem que “Até na tristeza o inimigo se compadece, difícil é suportar a alegria do outro”.
Talvez hoje, estamos marcando o tempo. Nunca tiramos tantas fotos, como também nunca esquecemos de olhá-las alguns dias depois, ou alguns dias nunca. As músicas passam tão rápido. As amizades passam tão rápido. E assim são os sorrisos, os amores e as verdades. Não se concertam aparelhos, não se concertam relacionamentos. E o mais imenso, não se concertam conceitos.
Não creio que “ontem as coisas eram melhores que hoje”. Eu não tenho mais o ontem, eu tenho o agora. E é nesse agora que me estabeleço para dizer: porra, viver dói pra caralho! O ontem possui a mesma beleza que busco encontrar hoje. Estou escavando sem parar o agora, para não observar o É dos outros.