Quando
vi o relógio dentro da caixa no balcão de vidro, escapou de mim um “é esse”. O
primeiro impacto me levou a um desejo antigo: era desse que eu precisava.
Quanto sonhei com uma relíquia daquela no pulso direito. Observei o preço.
Analisei as formas de pagamentos. Contei meus trocados. Os valores se
equivaliam.
Olhei
o mostrador, o pino para dar corda, a pulseira, o fecho, os ponteiros. Meu
coração era de um menino recebendo a primeira bicicleta. Sim, será esse! As
formas de pagamentos também eram instigantes. Poderia pagar com cheques, com
cartão de créditos, mas optei por cédulas. A atendente observou o meu gosto
antigo e lançou-me um sorriso de selfie. O desdém da atendente jogou luz nos
meus desejos. Pensei em como abandonar um sonho antigo. Foi com esse pensar que
descobri os Outros que há em mim.
O
primeiro Outro queria o relógio antigo porque era sonho de criança.
O
meu avô ostentava com brandura a relíquia comprada em uma das suas viagens, que
ele dizia, ter feito na Suíça. Já o meu
pai adquiriu a sua relíquia na 25 de março. Como o meu avô, o meu pai adorava
dizer as horas. E quando ninguém perguntava, dizia: é um relógio caríssimo, mas
costuma atrasar as horas.
O
segundo Outro, desejava o relógio antigo para o pai.
O
presentearia no seu aniversário: vinte e cinco de dezembro. Quem sabe o velho
sentirá orgulho dos meus negócios e não mais me culpará pelo sumiço do seu
relógio.
O
terceiro Outro, entrou na loja seduzido pelas propagandas.