A viagem
começa no momento em que se decide viajar. Foi isso que Lucas ouviu e logo após
desligou o telefone. As caminhadas também merecem observações; há entre o ir e
o voltar a trajetória do ser. Não são os passos que nos levam, mas os
pensamentos que nos acompanham durante o caminho. Há quanto ele não a via? Estava
ali por um nome, Lorena. Conheceu-a no aeroporto de Brasília, numa dessas
viagens a trabalho. Ele observou a chuva cair, precisava caminhar. Queria ver a
cidade, as pessoas e se distrair olhando as lojas do lugar. As nuvens foram se
abrindo lentamente. A chuva continuava. Com um cair que não machucava por fora,
mas que molhava por dentro. Fechou o notebook e se colocou na janela do sobrado,
à espera que as pessoas lhe inspirassem uma nova história.
A
rua recebia um muro alto apenas de um lado, como se quisesse proteger suas
flores do resto do mundo. Temos nossos muros para as coisas que nos encantam,
mas que não nos interessam. Para tudo há “um” outro lado, lado este que já se acostumara
com os muros.
Desses dias que se acorda lembrando,
Lorena pensou no escritor. Uma conexão pode nos conectar a alguém pelo simples
fato de encontrar no aeroporto, alguém que não tem pressa de ir, mas que faz do
local no qual está um lugar de contemplação. A livraria, trazendo dúvidas nas
possibilidades. Depois de folhear vários livros ele comprou um. As possibilidades
machucam.
O
céu estava carregado, mas ela precisava da sua caminhada. Andar era mais uma
terapia mental que física.
Um
rabisco de sol inundou a rua molhada, de chuva e de vento. As águas cobrindo a
via eram como um rio, um rio raso, sem mistérios, e o seu espelho domava os
olhos dele. Seus olhos percorreram a extensão da rua alagada, mas não foi a
poesia da chuva contando chuviscos que o prendeu ali. Lorena. Sentada na
calçada, numa tarde de chuva, descansava da sua caminhada. Os cotovelos
apoiados aos joelhos, e com ambas as mãos controlava o para-chuva. Foi numa
levada de vento que ele a reconheceu. Seu rosto se descobriu por alguns
segundos, clareando a certeza que ele concebera no olhar. Linda. A chuva
continuou tocando o para-chuva que a protegia durante o tempo na calçada. A
imagem era uma poesia. Ela continuou sentada e com um sorriso que nega a boca,
esperou-o sentar. A chuva que lhes molhava os pés era digna de contemplação e,
se houve ali um apego, fora de um dia numa calçada, ele reencontrou Lorena,
quando o céu chorava.
♫