A menina nem esperou que o homem,
suponho ser o seu pai, terminasse a fala e já disparou: ninguém manda em mim. O
homem encarou a mulher, imagino ser a mãe, e bufou, ora seguindo a menina com
os olhos, ora olhando o prato dela por terminar. Gesticulou um “o que eu fiz” para
a mãe que se limitou em levantar os ombros e espalmar as mãos. A menina
caminhou por entre as mesas do restaurante com o celular na mão indo de
encontro a uma tomada. Achando, sentou e mergulhou no aparelho. A frase dela
ecoou em minha cabeça como aquelas músicas chatas de um refrão único que o cara
do lado coloca no seu celular e o som repete tanto que, mesmo a cabeça
recusando, a mente canta. Nesse caso, não mandamos na mente. O senhor
(imagino), pai da menina, aparentava ter cinquenta anos e o domínio das suas
experiências. Atendia o celular em intervalos relativos de três em três
minutos, e num desses atendimentos, pude ouvir: calma! Segura, aí! Já estou
indo. Desligou a chamada, anotou alguma coisa no aparelho, olhou firme para a
mulher em sua frente e disse: o chefe mandou que eu pegue o carro dele na
garagem. A mulher estreitou os olhos no homem: você insistiu que eu viesse e ordenou
trazer a Júlia, depois pergunta ainda: o que eu fiz? O casal fez menção de sair
e a menina os seguiu sem desgrudar os olhos do celular. Com a sensação de que
ninguém manda em mim, retirei meu cartão e paguei o almoço. Voltei a redação do
jornal e logo escutei o diretor cobrando. Só faltava o meu texto para fechar a
edição.