Estudar, ser curioso, amar o
conhecimento e questionar o que aprendemos têm suas vantagens: não somos massa
de manobras, e podemos ser bem remunerados por isso. Mas o lado douto também apresenta
desvantagens. Um intelectual um dia se casa, gera filhos e aprende que,
expandir-se no conhecimento, exige sabedoria para fazer parte do mundo dos filhos,
companheirizar a esposa, sentar com os amigos e se “parecer” com eles. Antes
que algum deles comece a dizer: Aí, vem chegando o doutor! Agora tá metido. Não
bebe mais com os amigos! Ou quando surge aquele assunto que você passou quatro
anos na faculdade estudando e que o amigo do amigo por trás de um copo, (e que sabe
a marca da cerveja porque o barman falou), resolve debater. Pois é. Sabemos que
insistir no assunto num momento como esse é perda de tempo. Até porque não se
muda opiniões ou conceitos de forma radical.
Diferente do que acontece nas
igrejas, demora-se algum tempo para instalar novos princípios no ser humano.
Ainda que um pensamento possa nos tomar num segundo, custará um tempo para que
se torne uma ideologia. Sei que o leitor dirá: o meu mito consegue. De cá eu
não discuto a qualidade dos mitos. Não perco meu silêncio com o barulho dos
outros. E um pensamento crítico demanda de muitas leituras para as mudanças de
conceitos.
Voltando ao prazer e as
desvantagens intelectuais, agora diante dos filhos: uma menina de treze anos
que numa sexta-feira à noite, me faz sentar e acompanhá-la num episódio do
seriado “Para todos os garotos que amei”. Sendo que, antes, pediu-me para
escutá-la e reparar suas entonações enquanto fazia a leitura de um trecho do
livro “O mundo de Sofia”. Antes do filme, já no meu colo, pede-me se eu posso
doar um dos meus livros de Dostoiévski para a biblioteca da sua escola, porque
as suas amigas querem emprestado quando ela terminar.
O sábado é dia de acompanhá-lo no
jogo decisivo do seu time. Meu filho, com onze anos, duas vezes por semana
treina basquete e pretende ser profissional. No caminho para o ginásio ele me
mostra sua coleção de MCs. Antes que eu diga algum protesto ele liga o celular
e já dispara uma daquelas repetitivas. No instante em que a frase se repete na
sexta vez, ele abre uma janela no celular e mostra: MC Kalladão, MC Kalladin,
MC S#Konteuddo e MC Cachorrão. Não foi possível ver os nomes de todos MCs
porque já estávamos no pátio do ginásio e ele desligou suas preferências
musicais.
No sábado à noite a TV anunciou
exibir um ótimo filme. Animei assistir já que os filhos foram dormir na avó. Minha
esposa, em poder do controle da televisão disse, “Já que o filme é bem tarde,
assista comigo meus programas preferidos, depois eu vejo o filme com você”. E
assim exerci meu companheirismo diante de Master-Chefe, novela e fábrica de
casamento. Quando o “Gênio Indomável” começou, meu sono acordou. Ela dormiu.
Como se todos os sonos acumulados durante anos fossem designados para aquele
instante.
LL!N
zurC