sábado, 23 de novembro de 2013

QUASE TODOS OS GRITOS.

FOTO DE REPRODUÇÃO
 

Ruas velhas, lembranças novas.
—!
Há dias em que tudo se parece. Não se acha o que se busca e os olhos encontram coisas que passam apressadas, depressa demais para se ter um reconhecimento qualquer.
—?!...
Janelas que se abrem no alto, pés que tocam o chão ruborizado de um cotidiano sem rumo. Um homem na calçada tece a arte, o que caminha pela calçada tece a vida, desconectada do mundo. Ambos se procuram.
O vento agita as árvores, os pensamentos agitam o homem. A existência agita o homem que se parece com a árvore. Fixos, se movem com os fenômenos da vida. Díspares, necessitam da terra. Carecem do ar e dos ventos. Não os ventos que arrastam coisas, mas um vento brando que parece sem rumo, porém, faz da sua missão a direção.
E se o agora começasse agora? E agora mesmo a surpresa me surpreendesse? O ontem não seria mais ontem. As emoções amanhecidas seriam novas; as pessoas conhecidas seriam novas, as desconhecidas também.
— ...
Se o agora começasse agora eu seria de qualquer jeito. Ainda tenho dores do ontem. Dores lembradas. Cheias de floreios emancipados. Se o agora começasse agora, agora mesmo me buscaria. Repreendia-me. Articulando com fala de monges.
— Meus gritos são baixos.
—?!
— Altas são as minhas indagações insurgentes.
—?
— Tenho tantos gritos. Eles se embrenham por caminhos que convencem os olhos a arrastar os pés, indignados.
—...
As ruas são velhas, o meu caminhar é novo. Nas vitrines, novidades. Novidades também no pensar. Observo dois livros, mas só posso comprar um. Dentro de mim há dois diálogos. Um se expressa com palavras curtas. — An?! Sim! É? Hum... — Deixo os livros e compro um celular: as possibilidades machucam, mas são ótimas para resolver problemas.




sexta-feira, 22 de novembro de 2013

TALVEZ EU FIQUE SONHANDO



Talvez eu fique sonhando...Talvez eu queira ser simplesmente, eu. Talvez eu queira voltar ao passado... Fugir do futuro.

Ficar no presente, é o meu rumo. Talvez eu queira esquecer... Esquecer de lembrar... Talvez eu queira simplesmente sentar numa janela

E sorrindo, ver o tempo passar...  

terça-feira, 12 de novembro de 2013

À DISTÂNCIA DO ONTEM.

Houve um tempo em que mãos estendidas
Expressavam ajuda
Houve um tempo
Nem faz tanto tempo assim

Era ontem
As novidades não ultrapassavam as pessoas
Nem as possibilidades as impediam de serem vistas.

Houve um tempo em que se estendiam as mãos
Que se abriam um sorriso
Que se olhavam nos olhos
Que se ouviam devagar
Que os diálogos não tinham pressa
Que um olhar podia dizer muito
Que a consciência era um valor
Que a ética era um sentimento.

Era ontem
As novidades não ultrapassavam as pessoas
Nem as possibilidades as impediam de serem vistas.

Houve um tempo em que mãos estendidas
Significava tantas coisas
Podia dizer, como vai?
Podia dizer, como estás?
Podia dizer:
Levanta!
Eu te ajudo!
Confia em mim!

Houve um tempo...
Era ontem...
Mãos estendidas...
Novidades...
Possibilidades...
Caraca, Velho!
Que antigo!


domingo, 10 de novembro de 2013

O ENCONTRO

                                                                                                         
                                                                                                                     FOTO DE REPRODUÇÃO
  Em meio a tantos sorrisos e vozes altas, um fitar de olhos pairava em minha direção. Um olhar que não olhava, mas que me via. Meu despertar foi de encontro ao movimento da visão. O tempo se consumiu, em segundos se refez no que era sério, penetrante, fugaz, mas que não irradiava medo. O sol do meio dia rompia árvores de longas sombras, os estudantes corriam de um lado a outro com a ansiedade de sempre e professores e alunos se misturavam ao se assentarem em banquetas de cimento tendo a suas disposições mesas de concreto. Por que o meu medo? Já não andei bastante no caminho do ensino? Não. Houve mudanças. O verbo aprender não indica o tempo, nem recomenda um momento exato. Aprender é instruir-se, conhecer um pouco mais do tudo é apreciar o nada. O meu coração bateu forte enquanto o sinal durou, depois que parou, cessou também a aceleração. Dizem que o medo paralisa, a mim não paralisou, mas a mistura da coragem e o medo provocaram um terremoto, meus joelhos confessaram o tremor. Andei em direção à sala, confesso, meio sem direção.
            A primeira conversa foi de uma rara calma, acho que não encantei, mas convenci. Trinta nomes, rostos desconhecidos. A expectativa desvirtua o ser e faz soma de dois: bom + bom = agradável. Bom, +, ruim = caos na sala.

            O sinal soou como uma trombeta, o meu respirar se desfez como um balão de ar. Final da aula. Lugar novo é estranho, tem muita coisa para ver. Digo estranho, pois, provoca emoção despercebida, desatenta, que quando desperta, não acrescenta.

Um velho num quadro acrescentou.

Abri os olhos, sorri da minha burrice, nunca havia lido Machado de Assis.

            A gravura na parede revelava minhas tolices. Não tive culpa por ser tolo. Machado não é uma obrigação, é uma consciência. Isso faltou a mim e ao professor que me forçava ler quando tomei gosto por leitura. Herculano ficou gravado na minha memória, mas hoje eu o troquei pela beleza de um Dom Casmurro. Penso em como foram os meus dias com Herculano. Os gibis da Mônica, do tio patinhas e os de bang-bang. Livros espíritas, filosofia, teologia e psicologia. Aprofundei-me nos livros de autoajuda. Queria buscar segurança em mim, na verdade queria gritar: sai de mim Herculano! Meu amor por livros não lhe pertence.
Hoje eu comprei um Machado, não pretendo cortar árvores, quero cortar de mim o amor que Herculano quis impor ao apresentar Dom Casmurro. Essa coisa de amor demais apaga o encanto. Amor para ser amor precisa apresentar graça, lisonjas, enlaçar doçuras, conquistar. Depois mostra a verdade, que para mim tem seu próprio tempo para existir. 
            O olhar que não me olhava, mas que me via, voltou a me encontrar. Com visão demorada esbarrei naqueles olhos como quem não queria ver. A agitação dos estudantes voltou a ganhar formas, com mais pessoas, os que eram e também os que não eram. A turma “A” se comportou bem. O programa educacional ganhou seu primeiro dia, eu ganhei certezas, certas para um recomeço.
Pouco a pouco a multidão se dissolvia. Do grupo ficaram alguns jovens, alguns professores e o diretor. De costas para mim, os cabelos da cor da noite ausente da luz da lua, cobriam-lhe os ombros. O tempo desandou. Andou com as horas. A sirene soou e a multidão dos que não eram, inundou o pátio. Senti saudades, pensei no quase velho que sou hoje. Uma professora saiu aos gritos praguejando um adolescente que fugiu da sua justiça. Pediu-me para que repreendesse o menino. Não podia, as minhas lembranças não permitiam, fiz pior que o garoto na mesma idade. Consciência pesada omite a ordem.
 Os jovens que estavam sentados levantaram-se fazendo menção de ir embora. E aqueles olhos que me conhecia, não de fala, mas de olhar, voltou a me inundar. Olhos que falam por silêncios, esperam encontrar corpos que desmerecem as palavras. Hevelin é cativante, de beleza rara e doçura nos gestos, de rosto meigo e olhar singelo, mas que não revela facilmente os seus mistérios. Eu precisava de amizades, ela buscava um amigo. Ambos descobertos num tempo que não era nosso, mas que existiu ali, por um olhar que não me olhava, mas que me via.  

terça-feira, 5 de novembro de 2013

FALTA

                                            FOTO DE REPRODUÇÃO
A gente cantou as canções que queria
Falou dos segredos que devia
Mas não se olhou, como se devia olhar
A gente escreveu todas as poesias.Escolheu as palavras enquanto ria. Mas não se olhou
Como se devia olhar
É que o tempo morria ligeiro
E levava de nós todo querer
De querer se querer.
É que o tempo movia de leve
Escondendo de nós todo o querer
De querer se querer.

domingo, 3 de novembro de 2013

O AMIGO ERA EU.

                                                                                           
                                                                                                              FOTO DE REPRODUÇÃO
O homem caminhava sozinho. Num banco da praça, um jornal abandonado. Naquele fim de tarde não chovera, e nem vento forte fizera. Ainda havia sol. As nuvens se ajuntavam no céu. A escuridão ameaçava chegar. Poucas eram as pessoas que ali estavam. Indagações dilaceravam o coração do homem que, no momento, tinha a mente cansada, os sentimentos machucados e os pés enfadados por caminhar sem rumo. Vendo o banco, sentou-se. Foi direto ao jornal.
“Não me atrevo mais aos versos, quero mostrar os meus reversos. Mudar, a vida concedeu. Eu perto de mim. Perto de mim como a roupa grudada, mas o amigo era eu.
Não entristeço o mundo tocando canções que me arremetem ao tempo. As minhas conclusões, descritas como um filme que agrada, desagradam. Um falso argumento, a vida concedeu. Eu comigo. Perto de mim, as pessoas sorriam, mas o amigo era eu.
Não reclamo ao coração a falta de um tempo austero, sem considerar que o NÃO é um SIM quando diz não. Dentro de mim, o que não era meu, estava comigo. Eu comigo. Pessoas me queriam, mas o amigo era eu.
Eu estava com pressa. O tempo destempava com pressa. Os diálogos dialogavam com pressa. Os olhares olhavam com pressa. A vida estava devagar, mas o devagar tinha pressa. Com pressa, me encontro ausente. Num tempo que não é meu. Eu estou sempre comigo, mas o amigo sou eu.
Vejo carros trocando pressas; sorrisos esboçando pressas; compreensões planejando pressas; incompreensões projetando pressas. Eu, com pressa, estou aqui. Como guerra que não acaba ou como música que não agrada. Estou aqui como quem deseja estar. As pessoas me olham. A gente sorri. Alegria, a vida me concedeu. Estou perto de mim, mas o amigo sou eu. 
O existir se arrasta. Segue sem rumo um discurso calvo. Busca um tempo que não é mais seu. Tão perto de mim, eu estava. Perto de mim? Sim, estou. Bons tempos a vida concedeu. Muitos comigo, mas o amigo sou eu”.
O homem não mudou de página. O jornal estava amassado. Provavelmente alguém mais o folheou e também não conseguiu mudar de página.

— Por que as pessoas não têm tempo se não criam nada? – indagou. Por uma estranha razão ele pensou na história de Narciso contada por Oscar Wilde. – Se mudassem os espelhos, a vida teria pessoas mais disponíveis, certamente. – Ponderou.