Texto extraído
do livro de crônica de Luis Fernando Veríssimo “DIÁLOGOS IMPOSSÍVEIS”
Meu caro: recebi
a revista com minha entrevista, que você não quis fazer por e-mail, como eu
tinha sugerido, nem com um gravador, como seria prudente. Confiou na sua
memória e nas suas anotações e o resultado aí está. Começando já na primeira
pergunta, sobre o meu método de trabalho.
Reconheço que não falo com muita
clareza, mas definitivamente não, repito não, disse que antes de começar a
escrever traçava uns miúdos, o que pode dar a entender que me preparo para o
trabalho atacando sexualmente crianças portuguesas. O que eu disse foi amiúde
faço traços no papel, esperando que venha a inspiração. Também não sei de onde
você tirou que só escrevo descalço e ouvindo Mozart.
Em outra pergunta, sobre o começo da
minha carreira e as leituras que me influenciaram, onde está “corcundas
libertários” deveria ser “concursos literários”, e onde se lê “Frei Beto”
deveria ser “Flaubert”. Não me lembro exatamente o que disse sobre o Machado de
Assis, mas tenho certeza que não o chamei de “prótese motora”. Talvez fosse
algo como “protomoderno”. Só saberíamos ao certo se você tivesse gravado!
Outra coisa. Sua pergunta sobre
escritores brasileiros meus contemporâneos.
Se eu for processado – e no caso do
Paulo Coelho certamente serei, depois que você botou na minha boca sobre ele –
farei o possível, para que você seja responsabilizado criminalmente. Não entendo
como a expressão “fenômeno cultural”, a respeito dos novos autores da era da
informática, possa ter saído como “fedor monumental”. Vou ter que telefonar
para vários escritores amigos meus para desmentir o que está na entrevista,
antes que mandem me bater.
Você também ouviu errado o nome da
minha mulher. Ela ainda não leu a entrevista, mas fatalmente me perguntará
sobre essa Lidia que, segundo você, é minha companheira e musa há tantos anos. Vai
querer saber onde eu a mantenho escondida.
Meus dados biográficos também saíram
errado. Eu não disse que fui adotado com um ano e pouco. Disse que nasci sem
cabelo e por isso fui apelidado de “Coco”. Na infância não gostava de andar
pelado na rua. Gostava de jogar peladas na rua. E não consigo imaginar o que eu
falei que levou você a escrever que na adolescência fui seqüestrado por um
casal de ciganos e levado para a Romênia. Eu deveria ter adivinhado que você entendera
errado quando antes de escrever me perguntou se o certo era “Romênia” ou “Rumênia”.
Também não sei como o senador Demóstenes Torres entrou na minha lista de atores
favoritos.
Por fim: eu disse que minha cor
preferida era o vermelho. Saiu “azul”. Foi o que mais doeu.
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
Excluir