domingo, 2 de dezembro de 2012

UMA QUESTÃO DE ELEGÂNCIA


A música do Roberto Carlos tocava no rádio de um dos carros parados frente à sorveteria em que estávamos. “Amanhã de manhã, vou pedir um café pra nós dois”. Tomávamos sorvetes, outros, cerveja. Antes, a canção “Eu e Ela” ganhara dimensões em nossos corações, mesmo não concordando com os dizeres: “Coisas lindas são faladas na madrugada”. – Na hora do meu sono não consigo dizer nada. Nem sonhando. Coisas bonitas são ditas na hora certa, agora, se for a Paula Fernandes, pode ser de madrugada, eu acordo.
Mara estava linda em cima dos saltos, mas confessara, aqueles sapatos lhe faziam bolhas nos calcanhares. A estética vale mais que o conforto? Penso que sim. Pensando por elas. Uma amiga minha economizou três meses para comprar um vestido que para mim não valia quinze dias, mas gosto é opinião e ter opinião é uma questão de opinião. No meio de tantos vestidos que cobririam a pele, escolheu um que não lhe guardava o corpo. Queria arrasar na festa. A natureza é feminina, mas desconhece a estética para propor o conforto. No dia em que a minha amiga usou o vestido, o tempo mudou. Tremendo, ela suportou o frio. Negou-se a usar um casaco, pois a jaqueta era feia, o vestido era lindo e ela estava elegante.
Mara estava elegante, mas os sapatos não pensavam assim – se é que os sapatos pensam, pois se pensassem, seriam inimigos mortais no dia em que não quisessem sair.
            Os cabelos soltos, compridos, negros. Calça justa e de tão justa parecia que o corpo escondia a calça e não a calça o corpo. A blusa com gola em “v” era normal.
— Amanhã de manhã, você vai pedir um café pra nós dois?!! – Ela disse sorrindo. A conversa voltou para a canção que ganhou pauta de filosofia.
— Posso pedir.
Falei. Mais querendo ser romântico que elegante. É uma estética. Você diz que me ama e eu vou responder da mesma forma para o instante ficar bonito. O conforto é verdadeiro. Pensei no quanto é elegante convidar alguém para tomar um café. Penso também como é deselegante convidar alguém para conhecer o apartamento. O café é um grão que se torna pó, que vira líquido. Depois de fervido se torna elegante. Todo mundo convida ou já convidou alguém para tomar um café.
— Acho cafona essa coisa de convidar uma mulher para um cafezinho...
Mara disse sem rodeios.
— Eu acho elegante. – Respondi convicto, pensando na teoria do professor Edilson Ortiz. Contou-me certa feita que, no intervalo de um curso, notou que a sua colega – também adepta à ideia de que é cafonice convidar alguém para um cafezinho – aguardava o pessoal para os comes e bebes. Ele, certo da sua teoria, usou a prática para convencer a moça, que não mudava de opinião. Enquanto ela esperava, ele lhe apresentou dentro de uma bacia outro fruto da terra, uma banana.  A moça espantou-se. Observou o gesto sem entender. Depois de esboçar um embaraçado sorriso, indagou:
— “O que é isso”?!
 Ele explicou:
— Já vi muita gente convidar alguém para tomar um café, mas nunca vi ninguém convidar outro pra comer uma banana.
A moça mudou de expressão e aderiu-se a elegância de um cafezinho.
Depois de ouvir, Mara lançou-me um olhar demorado.
— Amanhã de manhã, vou fazer um café pra nós dois...
Sorri.
— Que tal à tarde?
— Pode ser. Um convite para um cafezinho é elegante a qualquer momento.

Um comentário:

  1. O que é elaborado é elegante, na minha opinião. O café é elaborado e envolvente com seu aroma

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